domingo, 26 de novembro de 2017

Fácil não é...

Foi na Praça do Comércio, nas últimas semanas em Lisboa, onde fui fazer o meu estágio doutoral sanduíche, conversando com minha amiga, Andrea Moreno, que pensei pela primeira vez na ideia de vir para Baldim escrever a tese. Eu e o menino não tínhamos mais casa, nem móveis, só duas malas, alguns livros e umas poucas roupas, a maioria ganhadas de segunda mão. É verdade que tínhamos acumulado muito, mas eram coisas que não cabiam em malas. Tive que convencer o menino, que não gostou nem um pouco da ideia de sair de uma metrópole mundial e vir para uma cidade no interior de Minas com cerca de 8 mil habitantes. Mas viemos. Chegamos em julho de 2014. A opção por Baldim foi porque sem emprego, vivendo ainda de bolsa, não tinha como montar uma casa que ainda seria provisória. Não foi uma decisão fácil. A casa não é só minha, é a única herança material deixada por meus pais. Uma casa velha, carecendo de reforma. Pro menino foi mais difícil ainda, mas morar perto do pai, dos irmãos, da avó paterna pesou na balança e rapidamente ele fez amigos preciosos por aqui. E claro, viveu amores. Desde então, vamos levando, fazendo um esforço enorme para ressignificar. Morar aqui não é meu sonho de consumo. Sonho com o dia que teremos um cantinho só nosso, com um quarto e um armário para o menino, onde ele possa colar seu pôster do Tupac e tirar suas coisas das caixas improvisadas em armário. Eu, sonho com estantes para os meus livros espalhados aqui, em caixas de papelão; na casa da minha amiga Mariza, e da minha irmã Luia; alguns estão comigo na quitinete onde moro. Meus livros são meus bens mais preciosos. Quando cheguei aqui, o primeiro a me receber no portão foi Scooby. Eu nunca tinha convivido com cachorro. Enquanto escrevia minha tese, ele sempre por perto, sem incomodar, parece que compreendia. Depois, chegou Fridinha, uma cachorrinha de rua, toda perebenta, sempre maltratada pelas pessoas. Quando trocamos olhares, me converti a ela, que sempre vinha em busca de água e comida, até que um dia não foi mais embora. Hoje, até quando vou ao banheiro ela fica na porta me esperando. Agora, além das duas malas e dos livros, temos também uma cachorra. Cães dão trabalho? Muito! O cocô, o pelo espalhado pela casa, o cheiro que fica em tudo é o de menos. Difícil é quando chegam machucados da rua. Scooby já chegou sem parte da orelha e uma vez quase morreu de pneumonia. Sofri junto como nunca imaginei sofrer. Fridinha tem um problema de pele que não consigo dar jeito. Pra mim, eu compro shampoo de cinco reais, o dela custa mais de trinta e é o que ajuda em suas feridas pelo corpo. Por isso ela foi batizada de Frida. Eu tive que aprender a conviver e a gostar desses bichos. É um afeto que eu não conhecia. Assim, como aprendi a ressignificar a volta pr'aqui. Plantar milho, apreciar os passarinhos, caminhar pelo cerrado, foram formas de ressignificação de algo que parecia muito difícil. Por outro lado, estar aqui me levou para um lugar de memória, uma terceira margem, um lugar existencial que é onde recarrego as minhas energias com a coragem que a vida nos exige, sempre. Fácil não é, mas ninguém disse que seria, não é mesmo

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